Uma alma que quer ser abastecida na presença de Deus


Texto: Salmos 42 e 43

Introdução
. O Rev. Ronaldo Lidório, em seu livro “Konkombas – o nascer da igreja em uma tribo no oeste africano”, narra como as pessoas empreendiam longas jornadas para reunirem-se nos locais de culto, geralmente, debaixo de frondosas árvores. Dentre estas pessoas, destaca uma pessoa deficiente, que se arrastara por quilômetros, entre pedras cortantes e espinhos, somente para chegar ao culto, já ferida e ensangüentada.
. O salmo 137 destaca a saudade de Jerusalém que tinham os judeus exilados na Babilônia.
Enquanto estavam em Jerusalém, flertavam com o inimigo, desprezavam seu Senhor e se prostituíram com todos os seus vizinhos. Depois, quando feitos prisioneiros, descobriram que os vizinhos não eram amantes, mas  terríveis algozes e implacáveis inimigos. Sentiram então grande saudade de Jerusalém e para lá quiseram voltar, pois lá estava o templo, a Casa de Deus.
. Contudo, sabemos que Deus não habita templos ou casas feitas por homens. Jamais habitou ou habitará. O templo em Jerusalém apenas indica sua especial habitação entre os judeus, mas não poderia contê-lo. A adoração era templária nos sentido de uma construção especial indicar uma especial afeição do Senhor por seu povo, dentre todas as demais nações. Hoje, entretanto, somos nós os templos de Deus. O Espírito Santo habita nossos corações. Somos morada do Senhor.

. Somos instruídos a não resistir ao Espírito, não entristecer o Espírito e não apagar o
Espírito. Devemos fazer da presença de Deus o maior anseio de nossa alma.
. Infelizmente, quantos já se acostumaram em apenas servir religiosamente ao Senhor.
Freqüentar alguma igreja, exercer algum cargo, contribuir com algum valor, deixar de fazer algumas coisas consideradas erradas e feias. Enganam suas almas, dizendo-lhes servir a Deus, quando nunca conheceram o Senhor. Outros, mesmo que já serviram ao Senhor, conseguem calar os gritos da alma sedenta por Deus e permanecer longe do Senhor.


Narrativa
. Os salmos 42 e 43 formam um único salmo. Em muitos manuscritos antigos não são
separados. Podemos lê-los como um único salmo, apresentando uma única e mesma mensagem.
. Não há como datar historicamente estes salmos. Sabemos somente que foram escritos pelos filhos de Coré, ou Corá. Provavelmente foram escritos no período dos reis, quando Davi já havia deixado o louvor ao encargo dos filhos de Coré.

Divisões

O lamento de uma alma afastada da plenitude da presença de Deus


1. O abatimento resultante do distanciamento de Deus
. Estes salmos foram escritos pelos filhos de Coré. Devemos entender muito bem o que esta informação tem a nos dizer. LEVI teve três filhos: Gérson, Coate e Merari. Dos três filhos, da família de  COATE, Deus separou aqueles que trabalhariam diretamente no serviço do santuário. Coate teve quatro filhos: Anrão, Jizar, Hebrom e Uziel.  ANRÃO teve três filhos: Arão, Moisés e Miriã. Da família de  ARÃO, bisneto de Levi, Deus fez seus sacerdotes. Da família de Anrão, neto de Levi, Deus separou aqueles que seriam seus sacerdotes.
. Seguindo por outro galho da árvore genealógica, do segundo filho de Coate, Jizar, nasce Coré. Portanto,  ARÃO, o sacerdote, era filho de Anrão, neto de Coate e bisneto de Levi.

CORÉ era filho de Jizar, neto de Coate e bisneto de Levi. Os pais de Arão e Coré eram irmãos e eles eram primos.
. Acampamento (Nm 1.53): Todos eram levitas. Eram da tribo que o Senhor escolhera como resgate por todo o povo de Israel. Eles não receberam herança de terras e cidades como as demais doze tribos. Sua herança especial foi cuidar da casa de Deus. Quando as doze tribos de Israel se acampavam ao redor do tabernáculo, três de cada lado, os levitas se acampavam entre o tabernáculo e as tribos. Eles ficavam mais perto de Deus e cuidavam da obra de Deus.
Gersonitas, meraritas e coatitas, cada família de um lado do tabernáculo, e as famílias de Arão e Moisés à frente do tabernáculo.
. Serviço (Nm 4): todos os levitas tinham encargos especiais na casa de Deus. O tabernáculo era uma tenda, móvel e desmontável. Quando Deus ordenava a marcha ao seu povo, o tabernáculo tinha que ser desmontado e carregado. Este era o serviço dos levitas. A família de ARÃO, dos sacerdotes, entrava no santuário e cobria todos os móveis (arca, altar de incenso, candelabro, mesa dos pães da proposição, altar do sacrifício) e os preparava para jornada. Os OUTROS FILHOS DE COATE, dentre eles a família de Coré, carregavam estas coisas santas. Os FILHOS DE GÉRSON carregavam as cortinas, peles e cordas. Os filhos de Merari carregaram as estacas, varais e bases. Arão desmontava e cobria os móveis, Coate carregava os móveis, Gérson carregava as cortinas e Merari carregava as madeiras.
. Desavença (Nm 16):  já aprendemos que Arão e Coré eram primos. Arão era sacerdote e cuidava de perto das coisas santas do santuário. Coré era quem carregava as coisas santas e de seus irmãos era quem chegava mais perto delas. Arão ministrava diante da arca da aliança, e Coré podia carregá-la, ainda que coberta. Contudo, isso não bastou para Coré, que desejou o cargo de seu primo Arão. Ele se juntou com Datã e Abirão, filhos de Rúbem, e requereram o direito de serem também sacerdotes. Foi uma rebelião de duzentos e cinqüenta homens. Moisés falou duramente contra Coré, dizendo que devia estar mais que satisfeito, pois foi escolhido para cuidar das coisas do Senhor. Moisés ordenou que estes homens pegassem seus incensários e se colocassem diante da tenda. Quando assim fizeram, Deus ordenou que todos se desviassem destas tendas e fez com que a terra se abrisse debaixo de seus pés, tragando-os vivos.
. A piedade dos filhos de Coré: Nm 26.10-11 nos informa que quando Coré, Datã e Abirão foram tragados pela terra com suas famílias, os filhos de Coré não morreram. Mas, porque não morreram? Só há uma possibilidade. Eles cumpriram o mandamento do Senhor e se afastaram da tenda de seu pai. Aprendemos que pais ímpios podem ter filhos santos. São os filhos desta descendência que escreveram estes salmos, e outros como 44 a 49, 84, 85, 87 e 88. Foram os que preferiram o Senhor às suas famílias que puderam escrever tão poeticamente seu amor por Deus.
. Como se não bastasse a história de infidelidade de seus pais e juízo do Senhor sobre eles, agora, por alguma razão desconhecida, estavam afastados da presença do Senhor. Estavam impedidos de assistirem em seus átrios.
2. O abatimento resultante da morada entre inimigos
. O mais provável, pelas informações do texto, é que tinham sido levados por inimigos para uma terra estranha.
. Os inimigos perguntavam com zombaria onde estava o Deus do salmista. A fé destes fiéis tornara-se motivo de chacotas entre seus adversários. Pelo que vemos, sequer tinham o direito de resposta.
. Os inimigos estavam oprimindo com tirania os fiéis servos de Deus. Estavam sofrendo pela distancia do Senhor, pelo abuso dos inimigos, e pela brutalidade dos algozes.
3. O abatimento resultante do afastamento dos trabalhos do Senhor
. 1 Cr 25 informa que o rei Davi regulamentou o ministério dos cantores no tabernáculo.
Dentre estes cantores estava a família de Hemã, neto do profeta Samuel, que por sua vez descendia de Coré. Eles eram responsáveis pelo louvor na casa de Deus, com harpas, alaúdes e címbalos. Durante as três principais festas judaicas (Páscoa, Pentecostes e Tabernáculos), todos os judeus saíam de todos os cantos para irem à casa de Deus, eles faziam grandes jornadas, alegres e festivas, animadas por cânticos de romagem, como o salmo 122, que fala da alegria de estar na casa de Deus. O salmista conduzia o povo de Deus com alegria para a casa de Deus.
Agora, não podia fazer mais seu trabalho.
4. O abatimento resultante das necessidades não supridas em Deus
. O salmista se compara a uma corça ou gazela, um animal frágil e indefeso, que está bem abaixo na cadeia alimentar. Sua alimentação é somente de ervas e vegetais, enquanto ele mesmo é alimentação para todos os carnívoros.  Assim, sua defesa é sua grande velocidade. É um animal muito ágil. Quando acuado por um leão, pode escapar, graças à sua agilidade. Contudo, é um animal que precisa de muita água. Quando empreende uma fuga, a sede ataca. Os cascos, com o forte atrito com o solo, se aquecem muito, e as corças precisam passar pelas águas para resfriá-los, senão, não conseguiria fugir mais. A falta de ribeiros para a corça, para se dessedentar e resfriar seus cascos, pode lhe ser fatal.
. Como uma corça sedenta e ofegante, que chega ao lugar do ribeiro e o encontra seco, assim é o salmista sem a presença do Senhor.
5. Um abatimento real, não encenação
. O salmista se declara sedento, ofegante, em lágrimas, suspirando, com a alma derramada e abatido.
6. A confiança na restauração divina
. Apesar de todo o abatimento do salmista, ele tem uma atitude de expectativa, de dias
melhores, de voltar para a casa do Senhor com toda a alegria. Ele consola sua alma com as lembranças do agir de Deus em dias passados.
. Ele tem certeza de que ainda louvaria o Senhor em sua casa. Ele não se contenta com seu estado real e atual.
. Deus é o Deus pessoal do salmista e seu grande auxílio.


A companhia do Senhor em meio às provações


1. A companhia do Senhor numa dor que não pode ser esquecida
. A dor da distância: já analisamos a dor infligida na alma do salmista por estar distante da casa do Senhor. Vimos também que Deus era o Deus pessoal do salmista e que nEle estava sua esperança de restauração à casa de Deus e ao serviço de Deus. Contudo, ainda que o salmista dissesse à sua alma de sua inabalável confiança no Senhor, a dor continuava persistente em seu coração.
. A dor agravada pelo insulto inimigo: o salmista informa agora que os inimigos falam com insulto contra sua fé. Perguntam onde está o seu Deus.
2. A companhia do Senhor em meio às provações
. As características das provações: o salmista fala das terras do Jordão, do monte Hermom e do outeiro de Mizar. No monte Hermom ficavam as nascentes do rio Jordão. Com as fortes chuvas, as enxurradas formavam grandes catadupas ou cascatas, abrindo grandes abismos no chão. Cada abismo aberto pelas águas provocava outros abismos.  O salmista se enxergava nestes grandes buracos, com muitas águas passando por sua cabeça. Sabemos que as provações são diferentes das tentações. Enquanto estas vêem do inferno e visam nossa destruição; aquelas vêem dos céus e visam nossa edificação. Segundo Tiago, as provações são para o povo de Deus,
são variadas, são didáticas e são passageiras (Tg 1.2-3).
. O povo de Israel, incluindo os levitas, por várias vezes, cometeram vários erros. Em alguns destes momentos, Deus permitiu que os inimigos se assenhoreassem dos judeus, fazendo-os servir com tirania. Por meio do profeta Isaías, Deus apresenta seu propósito nestas circunstâncias, que era purificar o povo de Deus de seus pecados (Is 48.10). O salmista sabia que havia um propósito divino para o que enfrentava.
. O consolo em meio às provações: após falar das provas que enfrentava, o salmista informa o cuidado  de Deus que estava sobre sua vida. Durante os dias o Senhor lhe concedia sua misericórdia, para que vencidos os dias, nas noites, houvesse nos lábios do cantor um lindo cântico. Deus estava com seu servo dia e noite. Deus é o guarda de Israel que não dorme. Ele não dorme porque Ele é Deus e não tem esta necessidade humana. Ele não dorme porque nós dormimos e precisamos de cuidados especiais durante este tempo. Ele não dorme porque o diabo também não dorme e nos ataca dia e noite (Ap 12.10). O salmista louvava à noite porque Deus cuidava dele à noite.
. Notamos que um servo de Deus, escolhido para louvar ao Senhor, mesmo que não pudesse conduzir a congregação ao louvar na casa de Deus, não parava de louvar a Deus. Havia louvado a Deus entre a multidão em festa, mas louva a Deus no abatimento de seu coração. Louvara na alegria, mas louvava também nas provações.
3. A companhia do Senhor que traz a confiança na restauração divina
. O refrão destes salmos é mais uma vez apresentado. O salmista relembra à sua alma abatida que não precisava mais se perturbar, pois seria restaurado Deus e o louvaria de novo em sua casa.

A expectativa pela restauração à presença do Senhor


1. O juízo sobre os inimigos
. Já notamos que os inimigos eram a causa do desgosto do salmista. Era por causa deles que ele estava afastado da casa do Senhor e de seu divino serviço nesta. Estes inimigos ou nações contenciosas eram povos sem qualquer graça de Deus sobre suas vidas. Estavam afastados de Deus e do Deus da aliança. As promessas do Senhor não caíam sobre eles. Portanto, se não eram alvos da graça de Deus, eram alvos do juízo de Deus. O salmista suplica a justiça do Senhor em seu benefício.
2. A restauração à casa de Deus
. Com o julgamento dos inimigos, o fiel servo de Deus se veria livre para seu retorno à
Jerusalém, o santo e inabalável monte de Deus. Jerusalém era a cidade da paz; o monte no qual o Senhor proveu o sacrifício para Abraão não ter que sacrificar seu filho Isaque; o monte no qual Deus poupou o filho de Abraão do sacrifício, mas não poupou seu próprio Filho Jesus, sacrificando-o por nós. Em Jerusalém estava o templo, a casa de Deus. Voltar para Jerusalém era voltar para a plenitude da presença de Deus.
3. A restauração ao serviço de Deus
. O salmista não queria voltar somente para a casa de Deus; queria de volta seu serviço a Deus. Queria de volta sua harpa e sua escala de louvor.
4. A confiança na restauração de Deus
. O salmo termina com o refrão, repetido pela terceira vez, mostrando a confiança do salmista em seu Deus. O salmo terminou, mas não a história do salmista. Ele continuou aguardando a restauração do Senhor. Sua alma continuou entre inimigos, afastada da casa de Deus e do serviço de Deus. Ele continuou entre provações e insultos. Ele continuou crendo na restauração de Deus.


Pr. Washington Boone

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